quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Caso fosse homem

Acordo e olho o caos à minha volta. Tudo está confuso. Não encontro nada. Que raiva. Quero voltar para a cama. Caso fosse homem e os tempos não fossem estes seria executada. Não sendo homem e estando em tempos destes sou apenas mais uma mulher a tentar impor-se num mundo de homens. 
Fala-se em igualdade mas não acredito nela. Aos olhos da geração anterior sou arrogante porque trabalho sem hora de fim e porque lido com o poder como quem está entre iguais: sem medo. Luto mais que um homem teria que lutar, esforço-me mais. Mas sou mulher, sou um bicho esquisito que antigamente era tratada como demente uma vez por mês. Aparentemente não tenho direito de lutar e deixar a arrumação para trás, não tenho o direito de crescer lá fora, porque o SUPOSTO é que seja uma fada do lar. 
Queimo sempre os tachos, deixo a comida apodrecer, nunca me lembro de por a roupa a lavar. 
Olho para o meu ninho caótico e só tenho duas opções. E nenhuma delas me agrada. 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Nascer do sol

São 8:25 e o sol nasce para mim. Um luz imensa e doce escorre pelas paredes do escritório e beija-me a face. Bom dia. O sol faz-me começar. A luz acelera-me a eficiência. 
Sinto a doçura de saber que a primavera está a chegar e que dias se vão estendendo e sinto uma alegria imensa. Se calhar, bem feitas as contas, ainda há esperança.
Devo viver um dia de cada vez com todos os sentimentos guardados e a valorizarem dentro de mim mas não posso desistir. Não agora. 

Esvaziamento

Esvaziamento. Parte de mim escorre para fora da minha alma e eu fico manca. O tempo esgota-se e sei que a situação vai piorar. Sei que vou bater no fundo. Há uma solidão que me persegue como uma sombra. Acompanha-me. Não me deixa em paz. Hei-de senti-la por fim integrar-se em mim e consumir-me. Apenas quero adiar o momento e o sofrimento, não gosto de sofrimentos graduais, prefiro sofrer tudo de uma vez. Não gosto de antever o que vem,  prefiro reagir no momento.
O único problema são aqueles momentos em que a sombra me toca e eu sinto o vazio: como uma caverna pegajosa e fria, desconfortável e dolorosa. 
Quando antevejo o amanhã sinto-o assim. 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Vapor

Deitei-me numa banheira de água a ferver. Senti a alma a sair do corpo e todos os músculos a deixarem de lutar. Cedi. Os vasos sanguíneos dilataram-se de calor, água e do vinho que escorregava pela minha garganta sequiosa. O vapor envolvia cada traço do meu corpo e a água parecia atribuir à minha pele uma tonalidade ainda mais branca. Senti o cabelo a flutuar no silêncio da água: a ausência de som descansa-me o cérebro. 
Brinquei com bolhas de sabão como se tivesse cinco anos e ouvi 7 vezes o relógio dos vizinhos dar badaladas. 
Não queria abandonar aquele abandono nunca. Nada me doía. Nada magoava. 
Só a liberdade de um corpo nu numa banheira cheia e um copo carregado de álcool a toldar-me o cérebro.  Todos os meus dias deveriam ter este fim. 

( Mas não ia ganhar para a água e gás.) 

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Hoje

Acordei hoje mais cedo que o previsto. Acordei porque ansiava pelo meu dia. 
Queria sentir-me assim todos os dias. Sinto um poder imenso a inundar-me e visto-me a rigor. Hoje sinto-me segura apesar das intempéries. Quero abraçar o dia e fazer cada minuto desdobrar-se em outros tantos. Hoje vou ouvir apenas aquilo que me faz bem e me faz feliz. Hoje vou ser feliz. 


(Tendencialmente quando decido que vou ser feliz em algum dia tende a ser um dia mau....não faz mal, é o que sinto )

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Equilíbrio

Saio pela manhã e temo o frio anunciado nos Media. Enrolo-me em lã que se cola aos lábios por causa do baton do cieiro. Não quero ficar com os lábios mais cortados do frio. 
Chego à marginal e a luz irrita-me os olhos: ainda estou demasiado cansada. Caminho a sentir aquele cheiro que todos odeiam a entranhar-se no cérebro e inundar-me os sentidos dando-me uma sensação de conforto que remonta à infância. Chamam-lhe cacimba, outros peixe podre outros dizem que é dos esgotos. Quanto a mim, prefiro sentir o cheiro como a antiguidade dos rios e dos oceanos: é um cheiro que cheira a história. 

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

No limite

Um dia quiseram convencer-me que uma pessoa chega a um ponto de cansaço e que desliga. É mentira: posso chegar ao limite do cansaço que entro automaticamente em piloto automático. 
Foi-se a agilidade do raciocínio. Foi-se a criatividade. Foi-se a energia. Fui-me.
O único problema é que é preciso continuar, o relógio continua a andar, o tempo continua a passar e quanto mais perto, mais longe... 
Valem os bravos que partilham comigo a viajem e que sofrem comigo pelos trilhos enlameados, as horas esfomeados e as noites em que não há início nem fim. 




*Vejo uma escrita estática e desinteressante... a criatividade adormeceu há dois dias atrás quando o lado esquerdo tomou conta da gestão do meu organismo. 

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Certo ou errado

Dizem-me " é errado". Pergunto então o que está certo e falam-me de valores religiosos. Pergunto pela génese do discurso antes da religião e a resposta é "eram selvagens". Presumo que devo deduzir que a civilização veio com a religião.
Contínuo e chego à conclusão que estou num estado muito primário do desenvolvimento humano. Aparentemente sou selvagem e pré-histórica porque escolho não ceder aos mesmos valores do resto do mundo. O caminho agora é por onde me apetecer.